
Adeus ao Papa do Povo: Francisco morre aos 88 anos e deixa um legado de fé, simplicidade e coragem
Primeiro pontífice latino-americano, Francisco enfrentou crises, rompeu tradições e aproximou a Igreja dos mais pobres e marginalizados
Francisco, o papa que conquistou o mundo com humildade e empatia, faleceu nesta segunda-feira (21), aos 88 anos, na residência de Santa Marta, no Vaticano. A notícia foi confirmada pelo Vaticano, que informou que a causa oficial da morte será divulgada às 15h (horário de Brasília).
O argentino Jorge Mario Bergoglio, que liderou a Igreja Católica por quase 12 anos, lutava contra uma pneumonia nos dois pulmões e chegou a ficar 38 dias internado. Recebeu alta há cerca de um mês, mas continuava em tratamento médico. Morreu em casa, como preferia, longe da pompa dos palácios.
“Francisco retornou à casa do Pai. Sua vida foi um testemunho de entrega, coragem e amor incondicional, especialmente pelos pobres e esquecidos do mundo”, declarou o comunicado oficial da Santa Sé.
Última jornada começa hoje
O Vaticano já iniciou os preparativos para os ritos fúnebres. Ainda nesta segunda-feira será realizada uma missa em sua homenagem na Basílica de São João de Latrão. O corpo de Francisco será levado à Basílica de São Pedro na quarta-feira (23), onde os fiéis poderão se despedir.
Em um gesto que reafirma sua humildade até o fim, Francisco será enterrado na Basílica de Santa Maria Maggiore, e não na tradicional Basílica de São Pedro — algo que não acontecia desde 1903.
Um líder fora do comum
Nascido em Buenos Aires, em 1936, filho de imigrantes italianos, Bergoglio era formado em Química e também lecionava Literatura antes de seguir a vida religiosa. Tornou-se o primeiro papa jesuíta, o primeiro da América Latina e o primeiro a assumir após uma renúncia papal — a de Bento XVI.
Quando foi eleito em 13 de março de 2013, ele próprio disse que não queria o cargo. Ainda assim, assumiu a missão com coragem e imprimiu um novo ritmo à Igreja, mais próximo do povo, menos burocrático, mais sensível às dores do mundo.
Crítico, reformador e político quando necessário
Durante seu pontificado, Francisco enfrentou as feridas mais profundas da Igreja: os escândalos de pedofilia, o machismo estrutural, a resistência às mudanças e a desconexão com o mundo moderno.
Defendeu a inclusão, permitiu bênçãos a casais do mesmo sexo, abriu espaço para mulheres em cargos de decisão e participou de debates sobre mudanças climáticas, migração e desigualdade. Ainda assim, foi criticado por não avançar mais — sobretudo por manter a exclusividade masculina no sacerdócio.
Na política internacional, não hesitou em condenar guerras, denunciar injustiças e chamar atenção para a crise humanitária de refugiados. Foi a voz dos sem voz em um mundo cada vez mais barulhento.
Papa das causas e dos gestos
Escolheu o nome Francisco em homenagem ao santo dos pobres e fez do combate à miséria o lema do seu papado: Miserando atque eligendo — “Olhou-o com misericórdia e o escolheu”.
Entre tantos gestos simbólicos, um dos mais marcantes foi quando, sozinho, em plena pandemia, rezou em silêncio na deserta Praça São Pedro — uma imagem que ficará gravada na história da humanidade.
Um papa que abriu portas
Francisco não foi um revolucionário dogmático, mas um reformador sensível que quis abrir janelas, oxigenar ideias e acolher quem a Igreja historicamente deixou do lado de fora. Recebeu um homem trans no Vaticano, disse que não cabia a ele julgar homossexuais, e defendeu que a Igreja fosse “um hospital de campanha, não uma aduana que separa bons e maus cristãos”.
Muito além dos muros do Vaticano
Mesmo entre agnósticos e não-crentes, Francisco era respeitado. Seu carisma, simplicidade e compromisso com os mais vulneráveis conquistaram até os que pouco ou nada tinham a ver com a fé católica. Ainda assim, enfrentou forte oposição entre os ultraconservadores, que o acusavam de “esquerdismo” ou “populismo”.
O homem antes do papa
Antes de ser Francisco, Bergoglio era um padre discreto, que evitava holofotes, andava de metrô e cozinhava a própria comida. Foi arcebispo de Buenos Aires, muito próximo das comunidades pobres. Tinha uma vida austera, bem diferente do estilo opulento que marcou outros líderes religiosos.
O último gesto: coerência até o fim
Francisco não renunciou, como fez Bento XVI. Mesmo debilitado, dizia: “Estou indo em frente”. Certa vez, profetizou: “Acho que meu papado será breve”. Durou 12 anos. Um tempo suficiente para deixar marcas profundas.
Agora, o trono de Pedro está vazio. E o mundo se despede não apenas de um papa, mas de um homem que fez da fé uma ponte, não um muro.