
Alta do IOF revela racha entre Haddad e Galípolo no comando da economia
Entre decisões inesperadas e desconfortos nos bastidores, o Ministério da Fazenda e o Banco Central mostram divergências que abalam a harmonia prometida no início do governo.
A relação entre o Ministério da Fazenda, comandado por Fernando Haddad, e o Banco Central, presidido por Gabriel Galípolo, parece estar longe daquela sintonia que marcou o começo do ano. O clima, antes de parceria pacífica — em contraste com a tensão entre o governo Lula e a gestão de Roberto Campos Neto —, começa a mostrar rachaduras evidentes.
O último episódio que escancarou esse desentendimento foi o anúncio da alta do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) sobre operações de crédito, câmbio e seguro. A medida veio como uma surpresa para Galípolo, que afirmou publicamente não ter sido comunicado previamente e demonstrou claro descontentamento. Nos bastidores, o clima esquentou com cobranças mútuas e insatisfação.
Apesar disso, ambos tentaram, na última sexta-feira (23), amenizar a situação. Haddad foi elogiado por ter recuado rapidamente na elevação do imposto, enquanto a Fazenda reafirmou sua confiança no presidente do BC. Ainda assim, a crise revelou um desalinhamento estratégico entre as duas equipes que até então prometiam caminhar juntas.
A tensão aumentou quando membros da equipe de Haddad deram a entender que Galípolo já estava ciente da mudança, algo que ele mesmo negou em rede social, contradizendo a versão do secretário-executivo da Fazenda, Dario Durigan. A explicação oficial foi que houve troca de informações sobre as medidas em geral, mas não um detalhamento específico sobre o aumento do IOF.
Fontes dentro do Ministério revelam que Galípolo foi consultado sobre mudanças no IOF apenas durante a formulação do projeto do Imposto de Renda, antes mesmo de assumir a presidência do Banco Central. Naquela ocasião, a ideia de taxar operações de câmbio para remessas ao exterior foi descartada pelo receio de que pudesse ser interpretada como controle de capitais — o mesmo temor que motivou o recuo recente.
Depois do anúncio da elevação do IOF, Galípolo compartilhou com a Fazenda o desconforto manifestado por agentes financeiros, que também levaram suas preocupações diretamente a Haddad. O Ministério então decidiu rever a medida.
Em evento na sexta-feira, Galípolo foi enfático: sua resistência à medida vem do receio que o mercado tem de que o IOF seja usado para pressionar a meta fiscal de forma indevida. Esse atrito não é novo. Desde fevereiro, havia mal-estar sobre a interpretação dos efeitos da alta da Selic na economia.
Enquanto a Fazenda fala em desaceleração e aponta para indicadores negativos, o presidente do Banco Central insiste que a economia mostra sinais de força, com desemprego baixo e renda em alta — algo que parece contradizer o aumento dos juros.
O secretário de Política Econômica da Fazenda, Guilherme Mello, reconhece que a política monetária já tem impacto, prevendo uma desaceleração no segundo semestre, mas nega que isso signifique uma crise.
Questionada sobre as divergências, a Fazenda minimiza, dizendo que os modelos usados para análise são diferentes, e que pontos de vista distintos não significam necessariamente um desentendimento.
Mesmo com a crise, Galípolo elogiou a “agilidade” da Fazenda em recuar parte das medidas, reconhecendo que o objetivo inicial era fiscal e ressaltando a importância da rápida resposta para evitar maiores danos ao mercado.