
Apagão de Transparência: Governo Lula tira do ar dados sobre R$ 600 bilhões em repasses públicos
Medida esconde informações sobre convênios, emendas e repasses a ONGs; decisão contradiz promessa de transparência feita por Lula na campanha
O governo federal, por meio do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI), mergulhou em silêncio um dos pilares da democracia: a transparência. Documentos essenciais que permitiam à população acompanhar como e para onde vai o dinheiro público foram simplesmente apagados do sistema TransfereGov, plataforma criada para monitorar repasses a estados, municípios e organizações não governamentais.
A estimativa é alarmante: cerca de R$ 600 bilhões em transferências agora estão sem rastreabilidade pública. Sumiram do ar notas fiscais, relatórios, planos de trabalho e prestações de contas. Na prática, ninguém mais consegue saber quem recebeu ou gastou esses recursos — e com o quê.
A justificativa usada pelo ministério foi um parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) sobre proteção de dados pessoais. Mas a própria AGU veio a público desmentir o argumento: o parecer não autoriza nem sugere o apagão. Em nota, a AGU deixou claro que não há qualquer impedimento para manter os documentos disponíveis, auditáveis e acessíveis à sociedade.
A decisão ainda escurece áreas sensíveis, como os repasses ligados ao chamado “orçamento secreto”, mecanismo já considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal por falta de transparência. Até transferências feitas a ONGs com dinheiro de emendas parlamentares foram encobertas.
O contraste com o discurso de campanha do presidente Lula é gritante. Durante a eleição, ele prometeu resgatar a transparência que, segundo ele, havia sido minada pelo governo Bolsonaro. Agora, no entanto, repete uma lógica de opacidade, vestida de justificativas técnicas que não se sustentam nem juridicamente.
O TransfereGov, lançado para substituir a Plataforma +Brasil, tinha justamente a missão de facilitar o acesso da população às informações sobre recursos federais transferidos. O governo afirma que a plataforma está sendo atualizada para proteger dados pessoais, mas, até lá, os documentos continuarão fora do ar.
Especialistas em transparência e controle social veem com preocupação o recuo. Para eles, o sigilo compromete a fiscalização, enfraquece a democracia e levanta sérias dúvidas sobre o real compromisso da atual gestão com a accountability — ou seja, a obrigação de prestar contas ao povo.