CNJ forma maioria para revogar afastamento da juíza Gabriela Hardt

CNJ forma maioria para revogar afastamento da juíza Gabriela Hardt

O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) formou maioria nesta terça-feira (16) para revogar o afastamento da juíza Gabriela Hardt, que foi a substituta de Sergio Moro na 13ª Vara Federal de Curitiba, que havia sido determinado pelo corregedor do órgão, Luís Felipe Salomão.

Também tem maioria para derrubar o afastamento o atual titular da vara da Lava Jato, Danilo Pereira Júnior.

Quem abriu a divergência sobre Salomão foi o ministro Luís Roberto Barroso, que se manifestou por revogar o afastamento de Hardt, Danilo e outros dois juízes que atuaram em ações relacionadas à Operação Lava Jato. O CNJ ainda decide se todos os afastamentos serão revogados.

Apesar de votar contra o afastamento, Barroso pediu vista (mais tempo para análise) sobre a possibilidade de abertura desse processo contra os magistrados. O ministro disse que não é possível avaliar toda a documentação sobre o caso, que foi juntado ao processo nesta segunda-feira (15).

Ao se manifestar contra o afastamento, Barroso, que também é o presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), fez uma série de críticas à determinação do corregedor.
Segundo ele, “nada justifica que essa decisão tenha sido tomada monocraticamente” na última segunda.

Ele disse que não havia faltas graves ou absoluta inaptidão para o cargo, e nem contemporaneidade nos fatos apurados ou urgência, para que houvesse o afastamento.

Para Barroso, grave foi o afastamento dos magistrados. Ele leu notas das associações de juízes que criticavam a decisão da Corregedoria.

Considero que foi ilegítima, arbitraria e desnecessária o afastamento dos juízes por decisão monocrática, sem deliberação da maioria [do CNJ], e sem nenhuma urgência que não pudesse aguardar 24 horas para ser submetida a esse plenário. Entendo que tal decisão contrariou frontalmente decisão do STF”, afirmou Barroso.

Antes dele, Luís Felipe Salomão votou pela manutenção e pela abertura de procedimento disciplinar para apurar a conduta deles.

Salomão reiterou os argumentos que apresentou nas decisões individuais de afastamento e que foram levadas para avaliação do plenário do conselho. O corregedor disse que chegou às conclusões após seis meses de inspeção da Corregedoria sobre os trabalhos dos magistrados.

O corregedor afastou nesta segunda Hardt, os juízes federais do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) Carlos Thompson Flores e Loraci Flores de Lima, além do juiz federal Danilo Pereira Júnior, atual responsável pelos processos da operação.

Ao votar pelo afastamento, ele disse que via gravidade nos atos dos magistrados e que, no caso de Hardt, sua manutenção fragiliza a credibilidade do Judiciário.

Hardt foi responsável por validar acordo entre o Ministério Público Federal e a Petrobras que geraria fundo da Lava Jato, suspenso pelo STF.

Ao decidir pelo afastamento, Salomão apontou suspeita de que juízes e integrantes da força-tarefa da Lava Jato atuaram para que valores oriundos das leniências e delações premiadas retornassem para a Petrobras e fossem usados para bancar esse fundo.

Em seu voto, o ministro disse considerar esse acordo um desvio de dinheiro público para atender a interesses privados. “Me soa temerário a homologação de um acordo nessas circunstâncias. Algum de nós homologaria um acordo desse jeito? R$ 5 bilhões, no total”, disse Salomão.

Segundo ele, “já se combinava com o americano de aplicar a multa [à Petrobras] lá fora para o dinheiro voltar para a criação da tal fundação”.

Como mostrou a Folha de S.Paulo, relatório de inspeção do CNJ apontou que os EUA obtiveram irregularmente provas contra a Petrobras sem objeção de procuradores da força-tarefa da operação.
À época do anúncio da criação do fundo da Petrobras, foi divulgado que o Departamento de Justiça dos Estados Unidos concordou em abater até 80% da multa aplicada à Petrobras se o dinheiro fosse usado para recompor danos à sociedade brasileira.

O corregedor do CNJ afirma que para que isso acontecesse houve uma negociação paralela com as autoridades dos EUA, e chamou o envio desses valores de “cash back”.

Já em relação ao afastamento dos outros três magistrados, Salomão afirmou que houve um descumprimento “frontal, consciente e voluntário” de decisão do ministro do STF Dias Toffoli quando decidiram pela suspeição do juiz federal Eduardo Appio, que foi responsável no ano passado pela vara da Lava Jato em Curitiba.

Na ocasião, Pereira Júnior estava atuando no TRF-4 como juiz convocado.
Para Salomão, o “descumprimento deliberado de ordem judicial proferida pelo Supremo Tribunal Federal atua contra a institucionalidade do país” e houve “indícios de cometimento de conduta frontalmente incompatível com a dignidade das funções de magistrado”.

Barroso, que votou após Salomão, disse que a validação do acordo da Lava Jato por Hardt foi feita em 2019, e que já se passaram cinco anos, por isso não havia urgência para o afastamento.
Também disse que a homologação de um ato judicial simples, de um acordo com a Petrobras e órgão público, não podia levar a magistrada ao afastamento. “Essa moça não tinha absolutamente nenhuma mácula sobre a carreira dela para ser sumariamente afastada”, disse Barroso.

O presidente do Supremo também disse que o afastamento de Appio pelos juízes do TRF-4 não foi um descumprimento da decisão de Dias Toffoli, porque a determinação, na visão dele, não abrangia os processos que foram julgados.

Antes do voto do corregedor, o subprocurador-geral da República José Adônis Callou de Araújo Sá se manifestou contra o afastamento.

Adônis disse que não discorda, porém, sobre a possibilidade de instalação de um procedimento disciplinar que aprofunde a apuração sobre a conduta dos magistrados.

“O juiz não pode ter medo de aplicar a lei com base na sua avaliação dos fatos. Tenho muito receio de afastamentos como os que são propostos nesta oportunidade”, disse Adônis, ao se manifestar em nome do Ministério Público Federal sobre a decisão de Salomão.

Adônis afirmou que acordos de leniência também destinaram dinheiro a outras estatais, como Eletrobras e Caixa Econômica Federal, que assim como a Petrobras eram consideradas vítimas de atos de corrupção.
Segundo o subprocurador, não houve questionamentos sobre esses repasses à época nem pela CGU (Controladoria-Geral da República) e nem pela AGU (Advocacia-Geral da União).

“Considero uma ideia infeliz dos colegas criar essa fundação”, disse Adônis. “[Mas] Não por conta da finalidade de aplicar, através da fundação, esses recursos em finalidades educativas de combate à corrupção. Mas é uma ideia ruim em função dos compromissos públicos que seriam assumidos.”
O subprocurador Adônis disse que magistrados experientes como os três não deveriam ser afastados devido a uma única decisão. Segundo ele, juízes devem dar a investigados “a mais ampla defesa”, e magistrados que são alvos de apurações “têm o mesmo direito”.

Durante a sessão desta terça no plenário do CNJ, o advogado de Hardt, Nefi Cordeiro, fez uma defesa da juíza e enfatizou que ela “apenas recebeu pedido de prioridade” em relação ao tema da fundação e do acordo entre Petrobras e autoridades americanas, mas que “jamais houve combinação prévia” sobre o que seria decidido.

Na última segunda-feira, a Apajufe (Associação Paranaense dos Juízes Federais) também criticou em nota pública o afastamento de Hardt e de outros juízes que atuaram em processos da Lava Jato.
A entidade disse que recebeu a decisão da corregedoria com “indignação e preocupação” e que são “incompreensíveis decisões que atinjam com tal ferocidade o exercício legítimo da jurisdição de magistrados reconhecidos e respeitados por seus pares”.

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