
Condenada pela Justiça, esquecida pela compaixão: o caso de Viviane, a idosa com câncer presa por 14 anos
Diagnosticada com câncer maligno, Viviane de Jesus foi condenada por participação nos atos de 8 de janeiro. Sua prisão levanta um dilema entre punição exemplar e respeito aos direitos humanos.
Uma história que mistura dor, política e justiça está provocando um turbilhão de reações nas redes sociais e reacendendo debates acalorados no Brasil. Viviane de Jesus Câmara, de 45 anos, enfrenta um câncer maligno e, ao mesmo tempo, uma sentença de 14 anos de prisão pelos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023, em Brasília.
A condenação, determinada pelo Supremo Tribunal Federal, colocou a idosa no centro de uma disputa entre a firmeza contra ataques à democracia e o apelo por humanidade diante de sua condição de saúde.
Condenação pesada em meio à fragilidade
Viviane foi acusada de participar da invasão e destruição das sedes dos Três Poderes e, por isso, recebeu uma das penas mais altas até agora entre os envolvidos. Entre os crimes apontados estão golpe de Estado, associação criminosa armada e destruição de patrimônio público. Segundo o STF, ela teria agido em conjunto com grupos que tentaram desestabilizar o regime democrático após o resultado das eleições de 2022.
A sentença veio da Primeira Turma da Corte, com relatoria do ministro Alexandre de Moraes, que destacou a gravidade coletiva dos atos. Além da prisão, ela e outros réus foram condenados a pagar, juntos, R$ 30 milhões por danos morais à sociedade.
Um apelo por clemência
A condição de Viviane trouxe um outro tom à discussão: o da humanidade. Diagnosticada com câncer agressivo, ela vem enfrentando dificuldades no acesso ao tratamento dentro da Penitenciária Feminina do Distrito Federal. Seu filho, Hiago, chegou a gravar um vídeo pedindo clemência ao ministro Moraes, afirmando que a mãe “precisa de cuidados, não de cela”.
A defesa tenta reverter a pena ou transformá-la em prisão domiciliar humanitária, argumentando que o cumprimento da pena em regime fechado pode acelerar o avanço da doença e coloca sua vida em risco.
O país dividido mais uma vez
O caso se transformou em combustível para o debate político. Parlamentares da oposição, como Flávio Bolsonaro (PL-RJ), passaram a defender anistia para os condenados do 8 de janeiro e apontam exagero nas penas, alegando que muitos, como Viviane, foram “manipulados” e agora pagam um preço alto demais.
Já a Procuradoria-Geral da República defende a manutenção das condenações, mas admite que casos com condições de saúde graves, como o de Viviane, podem justificar prisão domiciliar.
Enquanto isso, nas redes sociais, a hashtag #JustiçaParaViviane ganhou força, com mensagens que vão desde apelos emocionados por compaixão até defesas rigorosas da punição, mesmo diante da doença. “É cruel manter uma mulher com câncer atrás das grades”, dizia um post. Outro respondia: “Quem atacou a democracia precisa arcar com as consequências”.
O que vem pela frente?
Mesmo com a pena imposta, Viviane pode não passar os 14 anos na prisão. A legislação brasileira permite a progressão de regime após o cumprimento de parte da pena. Como ela está presa desde 2023, existe a possibilidade de que vá para o semiaberto até 2026 — ou antes, se a prisão domiciliar for concedida.
Outras mulheres envolvidas nos atos de 8 de janeiro, como Débora Rodrigues dos Santos e Adalgiza Maria Dourado, já conseguiram o benefício com base em questões médicas.
Quando a lei encontra a dor
O caso de Viviane é mais que uma sentença — é um espelho do Brasil atual. De um lado, a necessidade de responder com firmeza a ataques contra a democracia. De outro, a urgência de garantir que a justiça não seja cega à dor humana. A prisão de uma mulher doente reacende uma pergunta incômoda: onde termina o castigo e começa a crueldade?
Para o filho de Viviane, a resposta é clara: “Minha mãe errou, mas precisa de tratamento. O que estamos pedindo agora é humanidade”.