França quer erguer presídio de segurança máxima na Amazônia — e população da Guiana reage com revolta

França quer erguer presídio de segurança máxima na Amazônia — e população da Guiana reage com revolta

Prevista para 2028, prisão para traficantes e extremistas islâmicos será construída na Guiana Francesa, em meio à selva. Moradores denunciam imposição, falta de diálogo e revivem fantasmas do passado colonial.

A França anunciou a construção de uma prisão de segurança máxima em plena floresta amazônica, no território ultramarino da Guiana Francesa, o que tem provocado um verdadeiro levante entre autoridades e moradores locais. O novo complexo penitenciário, com inauguração prevista para 2028, será erguido em Saint-Laurent-du-Maroni, município encravado na fronteira com o Suriname e o Brasil — justamente onde funcionava uma das colônias penais mais temidas do século passado.

Com investimento de US$ 450 milhões (cerca de R$ 2,5 bilhões), o presídio terá capacidade para 500 detentos, incluindo um setor especial com 60 vagas destinadas aos presos considerados mais perigosos, entre eles, traficantes e pessoas condenadas por radicalismo islâmico — sendo 15 vagas exclusivamente para esses últimos. O anúncio partiu do ministro da Justiça francês, Gérald Darmanin, que justificou a medida como parte da “guerra contra o narcotráfico”.

Segundo Darmanin, o isolamento geográfico do presídio permitirá cortar o elo entre líderes do tráfico e suas redes criminosas. “A estratégia é clara: tirar de circulação os chefes do crime organizado. Essa unidade será essencial no combate ao narcotráfico”, declarou em entrevista ao Le Journal du Dimanche.

A Guiana Francesa, apesar de ser território francês, vive uma realidade social e econômica distinta da França continental — e amarga a maior taxa de homicídios proporcional do país: 20,6 mortes por 100 mil habitantes em 2023, quase 14 vezes acima da média nacional.

Saint-Laurent-du-Maroni, local escolhido para o novo presídio, é uma região já marcada por episódios de tráfico internacional, especialmente de cocaína, além de carregar cicatrizes históricas por ter abrigado o infame Campo Penal da Ilha do Diabo, que por mais de um século serviu como prisão para condenados e dissidentes políticos da metrópole.

Clamor por respeito

O anúncio, feito de forma unilateral pelo governo francês, foi recebido com revolta pelos representantes locais. Jean-Paul Fereira, presidente interino da Coletividade Territorial da Guiana Francesa, classificou a decisão como um desrespeito flagrante. “Foi com espanto e indignação que soubemos pela imprensa que nosso território será transformado num depósito de criminosos e radicais”, escreveu em comunicado.

Fereira lembrou ainda que o acordo original, assinado em 2017, previa a construção de um presídio para aliviar a superlotação do sistema prisional local — sem jamais mencionar a transferência de presos de alta periculosidade vindos da França continental.

Na mesma linha, o deputado Jean-Victor Castor denunciou a medida como “um insulto à nossa história, uma provocação política e um retrocesso colonial”. Para ele, a população guianense está sendo tratada como uma extensão descartável da metrópole, ainda sob a lógica colonial.

A proposta reacende traumas históricos e alimenta a sensação de que os guianenses, embora franceses no papel, continuam sendo tratados como cidadãos de segunda classe.

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