
Governo Lula Tenta Enviar Kits Contra Gripe Aviária Vencidos ao RS
Estado recusa materiais fora da validade e acusa falha do Ministério da Agricultura
O Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) protagonizou uma situação, no mínimo, constrangedora: tentou repassar ao Rio Grande do Sul kits de testagem para gripe aviária com frascos fora da validade e outros materiais prestes a vencer. A Secretaria da Agricultura do estado, claro, recusou a entrega.
A tentativa começou em abril, curiosamente antes mesmo da confirmação do primeiro caso de gripe aviária no estado, no dia 15 de maio, na cidade de Montenegro. Desde então, a situação se arrastou até a última semana, sem solução.
O material oferecido incluía frascos com uma solução química essencial para preservar amostras coletadas com os chamados swabs — aqueles cotonetes longos e estéreis usados também em testes de Covid. Faziam parte dos kits, além disso, caixas térmicas de isopor e embalagens homologadas para transporte aéreo de material biológico.
O problema? Os frascos estavam próximos do vencimento e, pior, parte das embalagens para transporte já tinha o certificado de validade expirado, o que tornava o uso ilegal.
O próprio Ministério admitiu que os produtos venceriam entre maio e junho e, por isso, recomendou que fossem retirados “o quanto antes”. Mesmo assim, o governo gaúcho recusou parte dos materiais.
O Rio Grande do Sul informou que até aceitaria os swabs e as caixas de isopor, que ainda seriam úteis. No entanto, a burocracia emperrou o processo: como o ministério só formalizou a doação dos frascos da solução, não havia previsão de entrega fracionada dos itens.
O impasse seguiu até depois da confirmação oficial do primeiro caso de gripe aviária no estado. No dia 17 de maio, técnicos gaúchos ainda tentaram salvar parte dos materiais — os swabs e as caixas de isopor estocados no Laboratório Federal de Defesa Agropecuária do próprio RS. Não conseguiram.
Procurado, o Ministério da Agricultura não respondeu aos questionamentos. Já a Secretaria da Agricultura do Rio Grande do Sul confirmou que rejeitou os kits, justamente por estarem atrelados aos frascos fora da validade. “Como estavam próximos da data de vencimento e o estado já havia adquirido esses materiais recentemente, não fazia sentido aceitar”, informou em nota.
O estado também garantiu que tem estoque suficiente para atender a atual demanda. Segundo o governo gaúcho, o Serviço Veterinário Oficial vistoriou 100% das 540 propriedades rurais dentro do raio de 10 km do foco de gripe aviária e também revisitou as 19 propriedades localizadas no raio de 3 km, onde há presença de aves.
O biólogo e epidemiologista Anderson Sena Barnabe, professor de Saúde Pública nas Faculdades Oswaldo Cruz, alerta: “É fundamental que os testes sejam feitos dentro da validade. Usar materiais vencidos compromete a precisão dos exames e pode gerar resultados falsos.”
Ele também destaca que a vigilância precisa ser constante. “Testagens periódicas, feitas de forma correta e com supervisão técnica, são cruciais para conter surtos como este”, completa.
O Brasil perdeu oficialmente, no dia 15 de maio, o status de país livre da gripe aviária, após a confirmação do primeiro caso da doença em aves comerciais. No mesmo dia, também foram detectados casos em dois cisnes — um negro e outro de pescoço preto — no zoológico de Sapucaia do Sul, no RS.
As amostras que confirmaram a doença foram enviadas para análise no Laboratório Federal de Defesa Agropecuária de São Paulo, após investigação conduzida pela Secretaria da Agricultura do RS.
O episódio acendeu um alerta: se até no enfrentamento de uma doença grave como a gripe aviária a gestão pública patina em burocracia e falta de planejamento, o risco recai, no fim das contas, sobre produtores, consumidores e sobre a segurança sanitária do país.