
Juiz de Garantias Atua em Caso de Filho do Ditador da Guiné Equatorial
Nova regra separa fase de investigação e julgamento para garantir imparcialidade
O caso envolvendo Teodoro Obiang Mangue, conhecido como Teodorin, filho do ditador da Guiné Equatorial, e denunciado no Brasil por lavagem de dinheiro, foi um dos primeiros a passar pelo modelo de juiz de garantias no Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3). A medida, que separa o juiz responsável pela investigação daquele que julgará o processo, começou a ser aplicada no início de 2024.
A investigação teve início em 2018 e foi concluída no ano passado, sendo enviada à Justiça Federal de São Paulo. O ponto de partida foi a compra de um apartamento de luxo no bairro dos Jardins, em São Paulo, por R$ 15,6 milhões em 2007. O caso ganhou novos desdobramentos quando, em setembro de 2018, Teodorin tentou entrar no Brasil com um passaporte diplomático, carregando US$ 1,4 milhão em dinheiro vivo e relógios avaliados em US$ 15,4 milhões. Com isso, a Polícia Federal (PF) ampliou as investigações.
Com base nas apurações da PF, o Ministério Público Federal (MPF) denunciou Teodorin por lavagem de dinheiro. Foi a partir desse momento que o caso passou para outra vara judicial, em conformidade com o novo modelo de juiz de garantias, assegurando que um magistrado diferente daquele que acompanhou a investigação fosse responsável pelo julgamento.
O que é o juiz de garantias?
A figura do juiz de garantias foi criada pelo pacote anticrime de 2019, com o objetivo de aumentar a imparcialidade no sistema judiciário. No entanto, sua aplicação gerou questionamentos e foi alvo de disputas judiciais que chegaram ao Supremo Tribunal Federal (STF). Após debates prolongados, em 2023, o STF considerou a medida constitucional e determinou que sua implementação ocorresse no prazo de dois anos.
Um dos principais pontos de discussão foi o impacto financeiro e operacional, já que o novo modelo exigiria mais magistrados para atender a demanda. No TRF-3, que atende São Paulo e Mato Grosso do Sul, a solução encontrada foi redistribuir os casos entre as varas criminais sem a necessidade de nomear novos juízes. Segundo uma resolução de janeiro de 2024, o juiz que acompanha a fase de investigação permanece no caso até o oferecimento da denúncia, momento em que o processo é redistribuído para um novo magistrado por sorteio.
Nas regiões onde há apenas uma vara criminal, o sistema adotado prevê uma distribuição regionalizada dos inquéritos e pedidos do Ministério Público, garantindo que um juiz distinto assuma a análise após a denúncia.
Primeiras impressões sobre a mudança
O desembargador Nino Toldo, integrante da comissão que elaborou as diretrizes do TRF-3, destacou que a implementação do juiz de garantias representou uma das maiores mudanças no processo penal brasileiro. Segundo ele, a preocupação foi minimizar os impactos financeiros e garantir que o novo modelo funcionasse de maneira eficiente.
“Não é uma implementação sem custo, mas buscamos fazer isso com o menor impacto possível, tanto financeiro quanto funcional”, explicou Toldo. Ele acrescentou que, durante o planejamento, foram considerados fatores como o volume de processos, a competência criminal de cada vara e a distância entre unidades da Justiça Federal.
Após quase um ano da implementação, a experiência no TRF-3 tem sido positiva, embora ajustes ainda possam ser necessários. “Na época, dissemos: este é o plano geral, mas à medida que desafios surgirem, vamos adaptando o modelo”, afirmou o desembargador.
A adoção do juiz de garantias promete trazer mais transparência e equilíbrio ao sistema penal brasileiro, mas ainda há desafios a serem superados para garantir sua efetividade em todo o país.