STF Mendonça derruba censura a especial de comédia de Léo Lins e anula demais penalizações
O ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF), revogou, na última quinta-feira (28), uma decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) de maio deste ano que havia proibido a exibição de um especial de comédia do humorista Léo Lins no Youtube, o qual já contava com mais de 3 milhões de visualizações. Além disso, outras restrições consideradas excessivas, como a proibição de Lins de abordar temas relacionados a grupos considerados minoritários e a limitação de sua permanência fora de São Paulo a no máximo dez dias, foram igualmente anuladas, até que o Plenário do STF julgue o caso.
Na decisão anterior, a juíza Gina Fonseca Correa, em atendimento a uma solicitação do Ministério Público de São Paulo, argumentou que Léo Lins estaria “reproduzindo discursos e posicionamentos que hoje são repudiados” ao mencionar em suas piadas temas como escravidão, perseguição religiosa, minorias e pessoas idosas e com deficiências.
As restrições impostas pela magistrada foram abrangentes: o humorista ficou proibido de publicar, transmitir ou mesmo manter em seus dispositivos qualquer conteúdo “com teor depreciativo ou humilhante em relação a raça, cor, etnia, religião, cultura, origem, procedência nacional ou regional, orientação sexual ou de gênero, condição de pessoa com deficiência ou idosa, crianças, adolescentes, mulheres, ou qualquer categoria considerada como minoria ou vulnerável”.
Ademais, Lins teve a obrigação de remover de todos os seus canais online qualquer conteúdo que fizesse menção a esses grupos. Ele também foi submetido à censura prévia, sendo proibido de mencionar tais grupos em futuras apresentações de stand-up. Na prática, isso limitava suas piadas a grupos sociais bastante específicos, como homens brancos, jovens, heterossexuais e sem deficiências, exigindo um cuidado extremo para evitar tocar em “temas sensíveis” mencionados pela juíza. A multa por descumprimento dessas medidas foi estabelecida em R$ 10 mil por dia.
A decisão provocou uma forte reação por parte dos principais comediantes do país, independentemente de suas inclinações políticas, que se manifestaram publicamente contra a censura e destacaram os sérios riscos que ela representa para a atividade humorística e a liberdade de expressão.
Na decisão de André Mendonça, ele questionou os termos utilizados pela juíza na decisão original, que resultou na suspensão do especial de comédia e nas demais medidas restritivas. Para o ministro, o TJ-SP não identificou quais falas específicas seriam consideradas criminosas. Pelo contrário, a decisão se limitou a emitir comandos genéricos de proibição ampla, usando o termo “quaisquer” para se referir a “arquivos de vídeo, imagem ou texto”, “conteúdos”, “comentários” etc., que, de forma abstrata, possam ser interpretados como “depreciativos ou humilhantes” para “qualquer categoria considerada como minoritária ou vulnerável”.
O ministro também ressaltou que a decisão da juíza foi além das decisões anteriores do STF em casos envolvendo liberdade de expressão. Segundo ele, a proibição ampla e genérica imposta a um profissional ativo na criação e apresentação artística humorística, restringindo-o de manifestar qualquer conteúdo que possa ser interpretado como ofensivo, sob ameaça de multa diária de R$ 10.000,00, caracteriza a conhecida censura prévia, cujos argumentos de peso não foram considerados no caso concreto.
Apesar de ter anulado todos os efeitos da decisão, Mendonça manteve a ação penal contra o humorista.
A defesa de Léo Lins celebrou a decisão como uma vitória da liberdade de expressão. O advogado Rodrigo Barrouin destacou que essa interpretação abre espaço para questionar os dispositivos excessivos da chamada “lei antipiadas”, sancionada pelo presidente Lula (PT) em janeiro, que, entre outras medidas, classifica como crime de racismo a contação de piadas sobre grupos considerados minoritários. As novas regras estabelecem uma pena máxima mais severa para piadas envolvendo esses grupos do que para crimes como furto e sequestro. “Foi uma grande conquista para a liberdade de expressão. Uma das consequências dessa atualização da Lei do Racismo foi a censura generalizada à arte. Acabou afetando não apenas as piadas, mas também livros e peças de teatro”, afirmou o advogado.
Recentemente, uma nova decisão judicial censurou as contas de Léo Lins no Youtube e no TikTok, além de bloquear o valor de R$ 300 mil de suas contas bancárias para o pagamento de multas por descumprimento da decisão anterior. Segundo o TJ-SP, o comediante teria desobedecido às medidas de censura anteriores. A revogação dessas medidas, no entanto, não consta na decisão de Mendonça. A defesa está avaliando a possibilidade de fazer um novo pedido ao STF para que essas determinações também sejam anuladas.