
“Viagem de Janja à Rússia mistura turismo, encontros diplomáticos e polêmicas sobre uso do dinheiro público”
Primeira-dama chegou dias antes de Lula, participou de eventos culturais e reuniões educacionais, enquanto oposição critica gastos e questiona legalidade da agenda
Desde o dia 3 de maio, quando aterrissou na Rússia a bordo de um avião da Força Aérea Brasileira com capacidade para mais de 200 passageiros, Janja Lula da Silva tem cumprido uma série de compromissos. Já são pelo menos 18 atividades oficiais registradas, a maioria com foco em cultura, educação e articulações com autoridades locais. Na lista: visita a museus, universidades, teatros e reuniões com professores e estudantes.
A viagem, no entanto, reacendeu críticas da oposição. Parlamentares apontam supostos abusos no uso de recursos públicos, já que Janja não exerce cargo oficial no governo. Uma ação popular aceita pela Justiça Federal em Brasília, movida por um vereador e um advogado, questiona a legalidade dessas viagens internacionais, mencionando destinos como Nova York, Paris, Roma e agora Moscou, todas realizadas sem função pública formal — mas custeadas pelo Estado.
Para a oposição, como afirmou o deputado Rodrigo Valadares (União-SE), o comportamento da primeira-dama ultrapassa os limites do aceitável. “Ela age como se fosse chefe de Estado, com agenda própria e sem transparência. O dinheiro público não pode bancar essa farra”, criticou.
A Advocacia-Geral da União (AGU), por outro lado, emitiu parecer dizendo que o papel de primeira-dama tem interesse público e que, por isso, os custos de viagens oficiais são justificados, desde que haja transparência. A viagem de Janja, aliás, foi autorizada por decreto presidencial com a justificativa de que ela promoveria a agenda brasileira nas áreas sociais, culturais e educacionais.
Durante os primeiros dias em solo russo, Janja participou de eventos com professores e estudantes, visitou o Teatro Bolshoi, a Universidade de São Petersburgo — que tem sido acusada de censura e repressão a dissidentes —, o Museu Hermitage, a Catedral do Sangue Derramado, entre outros locais. Também se reuniu com representantes do governo russo, incluindo o governador de São Petersburgo e a vice-governadora da cidade.
Sua agenda incluiu ainda um encontro com empreendedoras do BRICS, onde ela participou de um debate sobre a Aliança Global Contra a Fome e a Pobreza, tema que tem defendido desde a presidência do G20 por Lula.
A visita às universidades russas gerou preocupação entre especialistas, que veem nessas ações um esforço do governo Putin para ampliar sua influência política e cultural em países da América Latina, por meio do chamado soft power. Há receio de que isso leve a uma maior presença da propaganda russa no Brasil, a exemplo do que já ocorreu em países africanos como Mali e Níger.
Na quarta-feira (7), ela ainda se reuniu com o reitor da HSE — universidade que também vem sendo acusada de restringir a liberdade acadêmica e punir críticos ao regime russo — e participou de uma discussão sobre cooperação internacional.
Apesar das críticas, a assessoria da primeira-dama justifica sua antecipação à chegada de Lula como parte de um convite formal do governo russo, destacando a importância cultural e histórica dos locais visitados. Lembraram ainda que o Brasil é o único país fora da Rússia com uma filial do Teatro Bolshoi, localizada em Santa Catarina.
Na quinta-feira (8), Janja participou de um jantar oferecido por Vladimir Putin, já na companhia de Lula, que chegou à Rússia no dia anterior. No dia 9, ambos participaram da cerimônia do Dia da Vitória, evento polêmico usado por Moscou como demonstração de força militar e de apoio político de aliados no sul global.