
Mauro Cid e Suas Cinco Versões: O Labirinto da Delação que Pode Impactar Julgamento no STF
Mudanças de Depoimento e Contradições Levantam Dúvidas Sobre a Colaboração do Ex-Ajudante de Ordens
Ao longo de um ano e quatro meses, o tenente-coronel Mauro Cid, peça central na investigação da suposta trama golpista, alterou sua delação cinco vezes. Essa inconstância se tornou um dos principais trunfos das defesas dos outros réus para contestar as acusações no julgamento que ocorrerá no Supremo Tribunal Federal (STF).
Desde agosto de 2023, Cid prestou 12 depoimentos, intensificando o peso de suas declarações e ajustando versões até implicar diretamente o ex-ministro Walter Braga Netto, apontando-o como figura-chave em reuniões onde supostamente se discutiu estratégias para gerar “caos social”.
Delação Controversa e Questionamentos
A credibilidade da delação de Cid foi abalada por episódios como a divulgação de um áudio em que ele afirma ter sido pressionado a dizer “coisas que não aconteceram” à Polícia Federal. Esse fator levou advogados dos demais acusados a contestarem a validade das acusações e a pedirem a anulação do acordo de colaboração, algo já negado pelo STF.
Analisando aproximadamente 250 páginas dos depoimentos prestados entre agosto de 2023 e dezembro de 2024, O GLOBO identificou mudanças significativas no relato de Cid em pelo menos duas ocasiões, além do acréscimo de novas informações em outras três. A defesa do ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, por sua vez, alegou que a delação seguiu um cronograma estabelecido pela Polícia Federal e negou qualquer contradição.
A Estratégia das Defesas e as Repercussões no STF
A inconsistência nos depoimentos de Cid se tornou um dos principais argumentos dos advogados dos outros sete integrantes do chamado “núcleo central” da trama investigada. Em um levantamento que utilizou inteligência artificial, advogados chegaram a classificar Cid como “mentiroso” e tentaram minar o peso de sua delação.
O ministro Luiz Fux votou para tornar réus todos os denunciados pela Procuradoria-Geral da República (PGR), mas expressou ressalvas quanto às “omissões” nos relatos do tenente-coronel, afirmando que ele “a cada hora acrescentava uma novidade”. Essa crítica foi vista com bons olhos pelas defesas dos demais acusados.
Apesar das controvérsias, a delação de Cid foi sustentada por outros elementos investigativos. Ele afirmou que participou da redação de uma minuta golpista e de reuniões onde Bolsonaro esteve presente para discutir o tema. Esses relatos foram confirmados pelos ex-comandantes do Exército, Marco Antônio Freire Gomes, e da Aeronáutica, Baptista Júnior. Além disso, mensagens e registros de entrada no Palácio do Planalto reforçaram alguns pontos da narrativa apresentada.
A instabilidade nas versões de Mauro Cid promete ser um ponto-chave no julgamento, podendo tanto enfraquecer a acusação quanto ser usada para sustentar a gravidade dos eventos investigados.