
R$ 640 Milhões em Mãos Petistas: Governo Lula Turbina ONG Aliada em Programa Contra a Seca
Entidade ligada ao PT abocanha 85% dos recursos do projeto de cisternas; outras ONGs subcontratadas também têm vínculos partidários e histórico com o governo
No papel, o programa do Ministério do Desenvolvimento Social tem um propósito nobre: levar cisternas a famílias pobres do semiárido. Mas, na prática, o que se vê é uma concentração impressionante de recursos públicos em mãos bem conhecidas do PT. Dos R$ 756 milhões destinados ao projeto, nada menos que R$ 640 milhões — o equivalente a 85% de toda a verba — foram parar em uma única ONG, a Associação Um Milhão de Cisternas para o Semiárido (P1MC), comandada por dois veteranos do Partido dos Trabalhadores, filiados desde 1987.
O contrato foi assinado no ano passado, já no governo Lula, que prometeu revitalizar o programa “Água para Todos”, esvaziado durante a gestão Bolsonaro. Desde que foi criada, a P1MC já recebeu mais de R$ 2 bilhões ao longo de 22 anos. Dessa vez, o montante bateu recorde.
Mas a história não para por aí. Além de concentrar quase toda a verba em uma só ONG ligada ao PT, o programa ainda terceiriza a execução das obras para dezenas de outras entidades — muitas delas com o mesmo DNA político. O jornal O Globo identificou 37 ONGs subcontratadas, todas comandadas por petistas ou ex-integrantes de governos estaduais ligados ao partido. Juntas, essas entidades já embolsaram R$ 152 milhões, ou cerca de 34% do valor repassado à P1MC.
Exemplo disso é a Cooperativa para o Desenvolvimento Rural do Piauí (Cootapi), que recebeu R$ 9 milhões para erguer 775 cisternas no estado do ministro Wellington Dias. Seus dirigentes também têm histórico de cargos na gestão petista do Piauí. Outra, no Ceará, funciona numa casa modesta e tem à frente um ex-assessor de prefeito do PT. Em Pernambuco, quem coordena a ação é uma ex-assessora de deputado estadual do partido. E na Bahia, duas entidades comandadas por ex-candidatos a vereador pelo PT também levaram fatias generosas do bolo.
Apesar das denúncias e da forte presença de aliados políticos no comando das ONGs, o Ministério do Desenvolvimento Social diz que tudo foi feito dentro da legalidade, com base em critérios técnicos como experiência e atuação na região. Segundo a pasta, a ligação política não foi levada em conta.
Ainda assim, um alerta veio da Controladoria-Geral da União (CGU). Uma auditoria apontou que 31% das cisternas vistoriadas entre 2020 e 2022 apresentavam falhas, como rachaduras, infiltrações ou vazamentos. Dez por cento estavam completamente inutilizáveis. A CGU também chamou a atenção para o risco de concentrar quase todo o recurso em uma única ONG, ainda que tenha admitido que os critérios atuais priorizem quem tem mais tempo de estrada.
E esse modelo — com subcontratações em cascata e pouca transparência — preocupa especialistas. Guilherme France, da Transparência Internacional, alerta que esse tipo de estrutura dificulta o rastreamento do dinheiro público. Ele defende que, em contratos de valores tão altos, as exigências deveriam ser bem mais rigorosas, com medidas para evitar conflitos de interesse e garantir eficiência.
Não é a primeira vez que recursos para ações sociais sob comando do MDS viram alvo de polêmica. Em fevereiro, uma reportagem revelou que ONGs ligadas ao PT haviam recebido milhões para distribuir marmitas em ações contra a fome. Mas muitas das quentinhas nunca chegaram a quem precisava. O ministério suspendeu os contratos, e o caso entrou na mira da Polícia Federal, do Tribunal de Contas da União e da própria CGU.
O discurso do governo é de combate à fome e à seca. Mas, na prática, o que se vê é uma rede de favorecimento político que coloca em xeque a transparência e a eficácia de programas que deveriam atender justamente os brasileiros mais vulneráveis.